Auditor da CGU defende: “Leylane Silva no TCE/MA: uma brisa de esperança“


Por Eden Jr.*

Admito que os tempos recentes não têm sido nada auspiciosos para quem se dedica à tarefa de zelar pelacorreta aplicação das verbas públicas e adequação dos atos administrativos no país. Em verdade, assistir ao Senado Federal, num rapapé que reuniu bolsonaristas, petistas, tucanos, centristas e assemelhados, reconduzir Augusto Aras ao comando do Procuradoria-Geral da República, que em seu dizer teve como um dos grandes méritos de sua primeira gestão o aniquilamento da Operação Lava Jato como se a corrupção tivesse deixado de estar entre os principais males a atormentar o país, é angustiante.Testemunhar a prescrição de mais um processo contra o ex-presidente Lula, o caso do sítio de Atibaia, que envolvia acusação de corrupção e lavagem de dinheiro,sem o julgamento de mérito da questão, é desestimulante. Tomar consciência de que há mais de um ano o Supremo Tribunal Federal não decide se o presidente Bolsonaro deve depor, de forma presencial ou por escrito, no inquérito em que é acusado de tentar interferir indevidamente da Polícia Federal, é desconcertante.

Mas eis que nas últimas horas tomo conhecimento de que a colega Leylane Silva, auditora de carreira como eu,e atual chefe da Controladoria-Geral da União no Maranhão, se inscreveu no processo que vai escolher o novo Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão. Que novidade alvissareira e revigorante! É imprescindível que os bons tentem mudar o “estado de coisas”. A trajetória de Leylane encerra uma história de retidão e sucesso. De origem humilde, nasceu em São Luís Gonzaga/MA, onde, sempre estudando em escola pública,concluiu o ensino médio. Deixou o interior para se graduar em contabilidade na Universidade Federal do Maranhão, instituição pela qual, anos mais tarde, também se formaria em direito. Aos 14 anos começou a trabalhar como menorestagiário do Banco do Brasil, e aos 19 anos ingressou, pela via meritória do concurso público, na Procuradoria da Fazenda Nacional, na função de Técnico de Finanças e Controle. Prestou novamente concurso e, com 23 anos, alcançou o cargo de Auditor Federal da CGU (um dos mais desejados do país). Na CGU, aos 38 anos, veio a ser a primeira mulher a dirigir a entidade no Maranhão.

Formação em direito e contabilidade; décadas de prática na atividade de controle da gestão pública ediversas experiências como palestrante e instrutora de cursos de: licitação, fiscalização de recursos governamentais, investigação, combate à corrupção e detecção de fraudes. Intercâmbio na Universidade George Washington nos EUA, para aperfeiçoamento sobre a estrutura anticorrupção americana. Integrou inúmeras equipes em todo Brasil de trabalhos da CGU em parceria com outras instituições de controle. A carreira de Leylane, aqui sintetizada, a credencia, cabalmente, a assumir os mais elevados cargos da República, a exemplo daquele de Conselheira do TCE/MA.

Não que Leylane seja irrepreensível não é. Nem mesmo temos, costumeiramente, as mesmas opiniões sobre aspectos técnicos de nossas auditorias. Já divergimos bastante, por vezes com muita rispidez, mas sempre dentro da transparência e integridade pelas quais as relações profissionais devem se pautar. E possivelmente vamos ter várias outras discordâncias. Eu e Leylane não temos a mesma visão sobre política e não votamos nos mesmos candidatos. Mas não é disso que se trata. Isso não importa. Sou testemunha da dedicação e empenho de Leylane no cumprimento de suas atribuições funcionais. Quantos sábados, domingos e feriados trabalhando, para desempenhar com primazia suas tarefas? Quantas viagens, sem as condições materiais mais adequadas, para cumprir sua missão? Quantas vezes não foi necessário avançar noites e madrugadas para dar conta do trabalho?

Hoje, quando tanto se vulgariza o termo democracia, é indispensável lembrar, especialmente no estado mais pobre do Brasil, e no âmbito de atuação do TCE, que a democracia passa, inapelavelmente, por cuidar para que os recursos públicos, transformados em programas, em áreas como saúde, educação e assistência social, cheguem,satisfatoriamente, aos cidadãos mais necessitados do Maranhão quem percorre, por décadas, os nossos mais desassistidos rincões, monitorando a apropriada gestão de recursos, e vê a aflição dos desvalidos, sabe do que falo. E, ademais, que os responsáveis por eventuais desvios de verbas estatais sejam exemplarmente punidos quer um sultão ou um plebeu. Isso também é democracia. Ulysses Guimarães disse: “temos ódio e nojo à ditadura”. Os democratas por inteiro, que não tergiversam diante dos malfeitos, acrescentam: e da corrupção também”.

Que os deputados estaduais do Maranhão “façam a coisa certa”: conduzam Leylane Silva ao plenário do Tribunal de Contas do Maranhão. Mais do que Leylane, ganharão a própria Corte de Contas e a sociedade, por dispor do labor de tão habilitada profissional, e, de quebra, oportunizarão ato inicial da busca pela equidade de gênero, garantindo presença feminina em tão nobre espaço, hoje, e historicamente, dominado por homens.        

*Auditor da CGU; ex-auditor da Controladoria-Geral do Estado do Maranhão; ex-auditor do Tribunal de Contas de Roraima ([email protected])

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