É muito fácil fazer de graça com o dinheiro dos outros…

Por Edson Travassos Vidigal*

Na tal da “Era dos Direitos” (título de famosa obra de Norberto Bobbio) na qual temos vivido, o que não faltam a todos os cidadãos brasileiros são direitos e mais direitos. Sobretudo após décadas de governos ao redor do globo conduzidos por partidos autointitulados trabalhistas, sociais democratas e mesmo democratas.

Nossa iludida, mal amada e “corneada” Constituição de 88, que foi, em seu nascedouro, carinhosamente apelidada por Ulysses Guimarães de “Constituição Cidadã”, traz uma gama extraordinária de direitos maravilhosos, dignos de sonhos mirabolantes que assustariam até Tattoo e o senhor Roarke em sua estranha ilha da fantasia (uma ilha paradisíaca da década de 80 onde qualquer desejo podia ser realizado. Pra quem não era nascido, “google it”).

“_O avião, o avião!!!”, gritaria o pequeno e simpático anãozinho Tatto ao avistar as centenas de proposições legislativas que são apresentadas ordinariamente e tramitam no Congresso Nacional dando isenções a isso, criando gratuidades àquilo, anistiando aquilo outro, separando parte de determinados recursos para algum fundo muito legal que beneficiará determinado tipo de gente especial da sociedade, criando mais novos direitos para outros determinados tipos de gente especial, e outras coisas bem legais que fazem a gente encher os olhos de lágrimas perante tanta sensibilidade e bondade de nossos representantes eleitos para com o nosso povo.

Na ilha da fantasia de nossas tardes na Globo na década de 90, tudo isso seria implementado com um estalar de dedos do Sr. Roarke. E todos nós viveríamos felizes nossos sonhos mais libidinosos, pelo menos até o avião voltar pra nos levar embora da ilha e percebermos que tudo era apenas alguma alucinação tropical que, espera-se, deixou alguma lição.

Mas em nossa dura realidade onde sonhos se constroem da matéria, e não apenas de pensamentos bem intencionados, é preciso recursos materiais pra se implementar direitos, pra se construir caminhos, vidas, alcançar objetivos, sobreviver, viver, e até quem sabe voar e sonhar mais.

EM 2017, durante a discussão da Lei Orçamentária, ouvi uma vez do deputado Marcus Pestana (relator da LDO na época) uma frase que me tocou muito, que levo comigo e aplico na minha vida constantemente, e cito a cada oportunidade: “Projetos sem recursos não são projetos, são apenas sonhos”.

E acrescento: São apenas sonhos que nunca se concretizarão.

A lei de ouro da vida real é econômica mesmo.

Aprendi em minhas aulas na faculdade que a economia é a ciência que estuda o atendimento das necessidades materiais humanas a partir da escassez dos recursos.

E aprendi no decorrer de meus erros e acertos na minha vida particular, além da minha prática com a vida pública, que a base para se viver bem, para se ter paz, tranquilidade, estabilidade, para se sonhar otimista com perspectivas reais de se concretizar tais sonhos, é buscar uma vida financeira saudável.

Sanear as contas, poupar para as eventualidades, poupar para concretizar objetivos com planejamento. Gastar menos do que se ganha. Pagar primeiro as dívidas para deixar de gastar com juros, ter tranquilidade e poder se planejar sem ser surpreso pelas eventualidades que sempre ocorrem.

Trago aqui alguns dados sobre o orçamento de nosso país para 2019. A previsão é de que o Estado Brasileiro arrecade 3,38 trilhões de reais durante o ano. Desse valor, 758 bilhões (22,4% – quase 1/4 de todo o dinheiro) serão usados para rolagem de dídivas. Ainda, 379 bilhões (11,2%) serão usados para pagamento de juros de dívidas.

Ou seja, 33,6% de todo o dinheiro arrecadado, que sai do suor de nosso trabalho diário, é praticamente jogado no lixo por conta de más escolhas de nossos governantes. Por conta de corrupção, de populismos, de demagogia, de conversa fiada, de venda de sonhos e ilusões a todos.

Queria apenas lançar essas reflexões, para que cada um chegue às suas próprias conclusões. Deixo por fim, com esse mesmo objetivo, um trecho muito didático de um discurso de Margaret Thatcher, estadista britânica da década de 80:

“Um dos grandes debates do nosso tempo é sobre quanto do seu dinheiro deve ser gasto pelo Estado e com quanto você deve ficar para gastar com sua família. Não nos esqueçamos nunca desta verdade fundamental: o Estado não tem outra fonte de recursos além do dinheiro que as pessoas ganham por si próprias. Se o Estado deseja gastar mais ele só pode fazê-lo tomando emprestado sua poupança ou cobrando mais tributos. E não adianta pensar que alguém irá pagar. Esse ‘alguém’ é você. Não existe essa coisa de dinheiro público. Existe apenas o dinheiro dos pagadores de impostos. Por inventarmos mais e mais programas generosos de gastos públicos. Você não enriquece por pedir outro talão de cheque ao banco. E nenhuma nação jamais se tornou próspera por tributar seus cidadãos além de sua capacidade de pagar. Nós temos o dever de garantir que cada centavo que arrecadamos com a tributação seja gasto bem e sabiamente. Pois é o nosso partido que é dedicado à boa economia doméstica. Proteger a carteira do cidadão, proteger os serviços públicos essas são duas maiores tarefas e ambas devem ser conciliadas. Como seria prazeroso ‘gaste mais nisso, gaste mais naquilo’. É claro que todos nós temos causas favoritas. Mas alguém tem que fazer as contas. Toda empresa tem que fazê-lo, toda dona de casa tem que fazê-lo, todo governo deve fazê-lo, e este irá fazê-lo.”

* Edson José Travassos Vidigal é advogado membro da Comissão de Assuntos Legislativos da OAB-DF e da Comissão Especial de Direito Eleitoral da OAB-SP. Professor universitário de Direito e Filosofia, músico e escritor.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *