Por Ricardo Zimbrão Affonso de Paula*

O mundo vive uma pandemia. Isso é um fato. Tal pandemia impactou a economia. Isso também é um fato. Isso está exigindo um grande esforço dos países e as políticas econômicas adotadas até então já se mostram ineficazes para garantir a estabilidade econômica. Mais do que isso, a humanidade hoje precisa, para além da estabilidade econômica, de ordem social.

A história do século XX foi marcada por guerras, revoluções e uma grande crise econômica. Em todos esses momentos, a saída dos países diretamente envolvidos foi a economia de guerra. Essa, consiste em um conjunto de práticas econômicas excepcionais, aplicadas durante certos períodos históricos de forte instabilidade social geralmente, mas nem sempre, ligadas à ocorrência de conflitos armados. Uma economia de guerra, é, por definição, uma economia distributiva.

Sim. Estamos em GUERRA. Uma guerra contra um inimigo invisível, mas tão letal quanto um poderoso exército real. Em resumo, para o caso da pandemia do Covid-19, tais práticas tem como objetivo manter as atividades econômicas indispensáveis à sociedade. Em outras palavras, garantir acesso à comida, material de higiene e de limpeza e medicamentos.

Diversos governos como os da Europa, dos EUA, do Japão e grande parte das nações do mundo estão abandonando suas políticas fiscais austeras e abrindo seus cofres para garantir que as famílias tenham acesso à renda mínima com objetivo explícito de frear os efeitos da pandemia não apenas na saúde pública, mas também na economia. Entretanto, pensa-se que esse acontecimento histórico está caminhando para além das atenuações. Ou seja, precisamos de uma economia de guerra.

Vamos aos números. As estimativas mais conservadoras para o PIB na China em 2020, é de um crescimento negativo de ordem de 4%. Toma-se a China como parâmetro, pois aquele país representa 16% daeconomia mundial, 13% do comércio internacional, 39% da produção de bens e serviços e 18% das viagens e turismo. Ou seja, o mundo está muito exposto aos resultados econômicos dos chineses. A evidência está justamente na imposição de medidas rígidas de quarentena, promovidas pelo governo daquele país, para travar a propagação do vírus, e que levou a um golpe fatal em várias empresas e setores mundo à fora.

Focamos agora no Brasil. Excetuando a declaração de calamidade pública, que na prática flexibiliza o teto de gastos, as medidas econômicas anunciadas pelo governo no dia 13 de março são fracas e inócuas. Redução da taxa de juros Selic para 3,75% ao ano: não vai impactar no investimento. Voucher de R$ 200,00 para as famílias vulneráveis: tímida demais. Redução de jornada de trabalho e de salários: absurdo completo. O governo brasileiro vai na contramão do mundo. ÉIRRESPONSÁVEL.

A humanidade necessita de ações coordenadas para vencer a guerra contra o Covid-19. Isso é um fato. A realidade nos impôs esse desafio. Portanto, somente uma estratégia de economia de guerra será eficiente. Em que consiste essa estratégia?

Primeiro, o diagnóstico. Os mercados financeiros do mundo todo estão derretendo e os investidores institucionais correram para os bancos centrais das economias mais fortes para proteger seus respectivos capitais. Na verdade, aceitam pagar para guardar seu dinheiro (as taxas de juros no longo prazo nesses países há muito estão negativas). Também, os investidores individuais estão liquidando suas posições nas bolsas, em busca de liquidez para passarem por essa crise sanitária.

O resultado disso é uma diminuição brutal do fluxo de capital em escala global. A corrente de comércio internacional também foi afetada, embora os dados de março ainda não estejam consolidados. Mas, o episódio da China já causou o impacto nas redes de suprimentos globais.

É dentro desse contexto que estamos vendo a valorização do dólar e o derretimento das moedas, em especial, as dos países emergentes, como o Brasil. Não adianta fazer hedge, há escassez de dólar no mundo. Política cambial em regime de câmbio flutuante agora é totalmente fora de propósito e somente vai exaurir as reservas do país. Também, não adianta baixar juros básicos. O setor produtivo continuará parado. A demanda agregada continuará caindo, com medidas paliativas anunciadas.

Precisamos, nesse momento de pandemia, de ORDEM SOCIAL. A economia é de extrema importância para mantê-la. Portanto, ECONOMIA DE GUERRA, que por definição, é DISTRIBUTIVA.

Propostas. Em primeiro lugar, zerar os juros de curto prazo. Garantir que as empresas tenham capital de giro para assegurar os empregos, os salários, dentro de uma jornada de trabalho reduzida. Juro zero para as famílias que necessitam de recursos para saldar seus pagamentos mensais.  Segundo: fixar a taxa nominal de câmbio a fim de garantir uma taxa compatível para manter as trocas essenciais do Brasil com o mercado internacional, além de proteger as nossas reservas em dólar. Aumentar o valor do bolsa família. Está se estabelecendo um consenso entre economistas de várias correntes, que elevar em 50% esse benefício ajuda na manutenção das compras das famílias de bens essenciais. Criar a renda básica emergencial para atender as 36 milhões de pessoas cadastradas no Cadastro Único.

Há uma discussão neste momento de que R$ 500,00 para os vulneráveis, por 12 meses, em princípio, é garantia de vida, tomando todos os cuidados sanitários. Por que não um salário mínimo para todos, questiona um incauto? Se tiver recursos suficientes e a emissão de moeda nova não causar surto inflacionário, é uma opção. O objetivo é garantir a vida. Para se garantir a vida precisa-se de ordem social. Para se manter a ordem social, necessita de uma economia que seja distributiva.

*Doutor em Economia. Professor Associado do Departamento de Economia e do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Socioeconômico da UFMA. ([email protected])

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