Pobreza e a investigação de suas causas
Por João Gonsalo de Moura*
A pobreza é a circunstância na qual os indivíduos sofrem privações de acesso aos meios necessários para suprir as suas necessidades básicas. Em todas as épocas e regiões este fenômeno sempre se fez presente, persistindo no seio da humanidade de forma inconteste até os dias atuais. Como os indivíduos e as regiões não são atacadas de maneira uniforme, a abordagem dominante a respeito deste evento indesejado tem como finalidade identificar as suas causas. Da mesma forma que a medicina necessita identificar com precisão as razões de uma doença para tratá-la de modo adequado, os cientistas sociais carecem de um conhecimento sólido a respeito dos agentes geradores da pobreza, para que possam habilitar-se a prescrever ações no sentido de erradicá-la.
Uma primeira alusão às verdadeiras causas da pobreza obriga os pesquisadores a oferecer uma resposta a um questionamento intrincado, qual seja: a privação de necessidades básicas é um fenômeno decorrente do destino ou das escolhas que os indivíduos fazem ao longo de suas vidas? Se a resposta apontar para o primeiro fator, então não há nada razoável que possa ser concebido, restando à humanidade apenas a oportunidade de decidir sobre a melhor forma de conviver com o problema. Ao contrário, se a solução indicar a segunda possibilidade, então o infortúnio passa a ter origem nas decisões das pessoas, dando margem à perspectiva de que sejam prescritas iniciativas que conduzam as escolhas individuais e coletivas para que se atinja um nível mais eficiente em termos de bem-estar social.
Portanto, acreditar que existe algo que possa ser implementado no sentido erradicar (ou minimizar) a incidência de pobreza é conferir às escolhas dos indivíduos um papel relevante. Se tal concepção passa a ser abraçada, então surge uma nova questão, a saber: quais são as escolhas que podem ser determinantes para posicionar as pessoas na condição de privação de necessidades básicas? De acordo com a literatura disponível as escolhas em relação ao nível educacional e a capacidade de acessar e processar informação estão entre os fatores mais importantes na determinação da condição social dos cidadãos em uma sociedade marcada pela livre iniciativa. Isto ocorre porque a educação é um pré-requisito indispensável para que se possa exercer tarefas mais complexas e bem remuneradas, enquanto a informação aclara quais são essas ocupações e onde as mesmas se encontram disponíveis.
Quando nos aproximamos da realidade vigente em uma unidade da federação como o Maranhão, marcada pela incidência de pobreza extrema, a pergunta relevante seria: se a pobreza é um problema grave no referido estado e se a mesma persiste ao longo dos anos, os indivíduos locais estariam então tomando decisões equivocadas e cometendo erros sistemáticos ao longo do tempo? Em vez de oferecer uma resposta clara a esta indagação, talvez seja mais pertinente resolvê-la com um novo questionamento: como os indivíduos tomam suas decisões a respeito das escolhas que determinam a sua condição futura em termos de atendimento das necessidades básicas?
Um dos princípios básicos que alicerçam a ciência econômica admite que as decisões dos indivíduos são movidas pelos estímulos produzidos pelo ambiente em sua volta. Para que as essas decisões alcancem o nível máximo de eficiência é necessário que vigore um sistema meritório, onde cada tomador de decisão possa se apropriar dos retornos decorrentes dos próprios esforços e iniciativas. A literatura pertinente sobre o tema tem revelado que os méritos dos indivíduos só podem ser assegurados e adequadamente recompensados em ambientes onde vigora: respeito do direito de propriedade; escola pública universal e de qualidade; infraestrutura econômica e social adequadas; acesso à informação; livre exercício dos direitos políticos; estabilidade institucional; trâmites burocráticos simplificados e um sistema tributário que não se aproprie excessivamente dos retornos dos investimentos privados.
Quando observamos as regiões do planeta com menor incidência de pobreza é possível constatar que as condições supracitadas estão presentes. Ao contrário, quando lançamos o olhar para as regiões da terra com maior incidência de pobreza é possível constatar que as circunstâncias acima externadas estão ausentes. Em casos como o do Maranhão, onde escasseiam aquelas premissas, não é exatamente pelo fato dos indivíduos fazerem escolhas erradas que a pobreza persiste. São os estímulos, causados pelo ambiente adverso, que conduzem os tomadores de decisão para a seleção de opções contraproducentes. Quando o setor privado não é suficientemente forte para inibir a presença do Estado na economia, como é o caso maranhense, os sinais emitidos pelo setor público passam a ser cruciais. Se este último emite indicações de que o mérito não é o fator prevalecente em seus critérios, privilegiando sobrenomes (oligarquias) ou a carteira de filiação partidária (estatismo), desaparece grande parte dos estímulos para os investimentos em acúmulo de capital humano, por exemplo, abrindo espaço para a baixa escolaridade e alta incidência de pobreza.
Portanto, faz todo sentido acreditar que as causas da pobreza são oriundas das decisões individuais e coletivas, sendo estas dependentes dos estímulos promovidos pelo ambiente. Para tratá-la adequadamente, convém compreender corretamente como agem esses estímulos. Cabe aos indivíduos tomar decisões eficientes para livrar-se da condição de privação. Cabe ao estado criar os estímulos adequados para viabilizar esta conjuntura. Um conjunto de estímulos enviesados é capaz de deturpar as decisões e perpetuar as condições pobreza. A pergunta final é: quais são os estímulos que o Maranhão vem promovendo?
*Doutor em Economia – Professor Associado do Departamento de Economia da UFMA ([email protected])