Pobreza versus desigualdade: qual deve ser o tema prioritário no Maranhão?
Por João Gonsalo de Moura*
Os dois termos centrais mencionados no título deste artigo constam entre aqueles que os maranhenses estão mais acostumados a apreciar em razão dos desdobramentos do debate político, da pauta do jornalismo e das próprias manifestações ocasionais de membros da academia e de outros setores formadores de opinião. Entretanto, de modo indevido, não é incomum que tais expressões venham sendo tratadas recorrentemente como sinônimos, quando, na verdade, se trata de fenômenos completamente distintos.
Por melhor ilustrar o argumento, uma sociedade na qual todos os seus membros recebam uma remuneração de igual valor (R$ 400,00 mensais, por exemplo) seria, ao pé da letra, uma sociedade igualitária. Porém, todos devem estar de acordo que, considerando o atual poder de compra da moeda brasileira, se trataria de uma sociedade caracterizada pela pobreza. Sendo assim, temos aqui um alerta para todos aqueles que esbravejam pelo igualitarismo como condição necessária e suficiente para o desenvolvimento. Este exemplo, embora deveras simplificado, parece suficientemente elucidativo para suscitar a inferência básica, de que uma população vivendo em um ambiente dominado pelas condições expostas jamais representaria desenvolvimento, mas, ao contrário, evidenciaria pobreza.
Para utilizar um exemplo real, quando o banco de dados Cidades e Estados, do IBGE, informa que o rendimento mensal domiciliar per capita do Maranhão foi de R$ 605,00 em 2018, e que no estado de Santa Catarina o mesmo indicador atingiu o valor R$1.660,00, abre-se aqui duas importantes frentes de debate. Comparando simplesmente os dois estados, teríamos como primeira alternativa enveredar pelo tema das desigualdades regionais, o que demandaria o envolvimento de uma mobilização nacional (talvez mais centrado na esfera federal de governo), visando o delineamento de políticas para amenizar as diferenças – algo legítimo. No entanto, mesmo que ainda fruto de uma comparação entre as unidades da federação, uma segunda alternativa seria reconhecer a nossa condição de pobreza relativa e, desse modo, teríamos que lançar o nosso olhar para dentro do próprio Maranhão e perceber que, internamente, a pobreza do cidadão mediano é o que reluz.
Independentemente do nível de desigualdade prevalecente no Maranhão, o indicador de rendimento acima explicitado serve como alerta a todos os maranhenses que clamam por uma distribuição igualitária, para que façam uma reflexão primária, qual seja: se tal iniciativa (utópica) fosse levada adiante, nas condições atuais, haveria mesmo distribuição de renda ou uma espécie de penalização dos seus habitantes a uma vida miserável? Convém esclarecer, que a ênfase na questão da desigualdade em um país como a Inglaterra, onde existe uma crescente desigualdade entre uma pequena classe de bilionários e a maioria dos cidadãos que já possuem as suas necessidades básicas atendidas (classe média) traz implicações totalmente distintas de uma ênfase na mesma questão em um estado como o Maranhão, onde o entrave se daria entre uma minoria, cujo padrão de vida não ultrapassa a condição de classe média, e uma larga maioria, que vive sob condições de pobreza e extrema pobreza.
Enquanto em um país que já atingiu o padrão de desenvolvimento da Inglaterra tal debate se torna por demais pertinente, no Maranhão o mesmo debate parece um tanto equivocado. Não resta dúvida que a prioridade por aqui deveria estar centrada no combate à pobreza e à extrema pobreza, uma vez que são bastante distintas as prescrições de políticas públicas quando o diagnóstico é desigualdade, vis a vis quando o diagnóstico é pobreza. No exemplo acima, políticas voltadas para uma melhor distribuição de renda no país europeu poderiam resultar em alguma perda para a classe dos bilionários e representar algum ganho para a classe média; enquanto que nas terras maranhenses tais políticas poderiam desorganizar o padrão de vida de uma incipiente classe média e produzir resultados positivos pouco expressivos para a classe dos mais pobres.
Apenas para trazer à tona mais um indicador real, tomando como referência 2014 – o último ano antes da atual crise econômica se instalar no país –, 13% dos maranhenses viviam na extrema pobreza, enquanto o mesmo indicador apontava 9% para o Nordeste, 4% para o Brasil e 2% para o estado de São Paulo, segundo dados do IBGE e do IPEA. Este cenário não deixa dúvida ao fato de que, quando pensamos no desenvolvimento econômico e humano dos maranhenses, a centralização dos esforços, na identificação das causas e na consequente eleição de medidas concretas para a redução de sua pobreza, precisaria ser uma prioridade escolhida por aclamação (sem necessidade de eliminar por completo o debate sobre a desigualdade). Como se trata de dois temas diferentes, diagnóstico e prescrições de políticas envolvem e requerem a distinção precisa desses males, sob pena de atacar o problema episódico (desigualdade), enquanto o distúrbio primordial (pobreza) se alastra.
O desenvolvimento não precisa ser um “jogo de soma zero”, onde se alguém ganha, então alguém deve perder. Ao contrário, podemos alcançar uma situação melhor, econômica e humanamente falando, onde muitos possam ganhar (os mais pobres), sem que ninguém tenha que ser condenado a perder (no caso do Maranhão a sua exígua classe média).
Parabéns, prof. Gonsalo, pela lucidez de sempre. Um lembrete: Santa Catarina tem o mesmo “tamanho” (aproximado) do Maranhão. Além disso, há muito mais utopia por trás desse “desejo” de igualdade, que leva a diagnóstico impreciso e prescrições equivocadas…
Triste com nossa terra rica em beleza pobre a população