‘Você enlouqueceu?’, perguntou Lobão a Cunha, segundo delator
Congresso em Foco
O senador Edison Lobão (PMDB-MA), ex-ministro de Minas e Energia, discutiu com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), após ele exigir o pagamento de aproximadamente US$ 5 milhões do ex-consultor da Toyo Setal Júlio Camargo pela viabilização de contratos de navios-sonda firmados pela Petrobras. Durante uma conversa por telefone, Lobão perguntou a Cunha: “Eduardo, você enlouqueceu”? É o que diz trecho de depoimento do lobista Júlio Camargo, em sua delação premiada, que serviu de base para o oferecimento de denúncia criminal da Procuradoria-Geral da República contra o presidente da Câmara.
Na denúncia apresentada nesta quinta-feira (20), Cunha é acusado de ter cometido os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. De acordo com a acusação, no dia 31 de agosto de 2011, Júlio Camargo foi ao gabinete do então diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, para pedir uma “reunião urgente” com o então ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.
O encontro tinha como objetivo discutir a apresentação de dois requerimentos perante a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, assinados um mês antes pela então deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), contra as empresas do grupo Samsung e Mitsui. Solange é aliada de Cunha e, de acordo com a PGR, esses requerimentos foram apresentados para pressionar Camargo a pagar a propina solicitada pelo presidente da Câmara.
A reunião entre Camargo e Lobão aconteceu na Base Aérea do Aeroporto Santos Dumont, no Rio, entre as 18h e as 19h, de acordo com a denúncia da PGR. “Após relatar ao ministro que se considerava ‘amigo do PMDB’, Júlio Camargo esclareceu que havia ficado surpreso com um requerimento da então deputada Solange Almeida, solicitando todos os contratos da Mitsui para serem apurados”, descreve o documento.
Na reunião, de acordo com a PGR, o ministro Lobão afirmou “isto é coisa do Eduardo”, em referência ao presidente da Câmara. Ainda para a PGR, com base nas delações do ex-consultor da Toyo Setal, no mesmo instante, o ministro ligou para Cunha e, na frente do empresário, reclamou. “Eduardo, estou com o Júlio Camargo aqui do meu lado, você enlouqueceu?” Segundo a denúncia, mesmo com a intervenção do ministro de Minas e Energia, a pressão não cessou.
Depois, conforme narra a denúncia da PGR, Camargo procurou o lobista Fernando Soares (o Fernando Baiano), tido como operador do PMDB, para que ele tentasse conter as pressões de Cunha. Novamente não obteve sucesso. Pela denúncia da PGR, a pressão contra as empresas ligadas a Camargo só diminuíram quando ele procurou diretamente o doleiro Alberto Youssef. Youssef aconselhou o ex-consultor da Toyo Setal a pagar os valores devidos ao parlamentar fluminense e, a partir daí, Camargo pediu uma reunião diretamente com Cunha para tratar deste débito.
Segundo a denúncia, a reunião entre Camargo, Fernando Baiano e Eduardo Cunha ocorreu em 18 de setembro de 2011, entre 19h e 21h, em um prédio chamado Leblon Empresarial. Pelas informações da PGR, Cunha chegou em um veículo Range Rover, placa EIZ 8877. O carro entrou no prédio às 19h14 e saiu às 20h03. De acordo com a acusação, foi nesta reunião que Eduardo Cunha pediu a propina de US$ 5 milhões.
Conforme a delação premiada de Júlio Camargo, apresentada ao STF, Eduardo Cunha disse que “não teria nada de pessoal” contra o lobista. Mas que ele precisava receber o dinheiro devido por Fernando Baiano, intermediário entre os dois na negociação. “Eu não sei da história, nem quero saber. Eu tenho um valor a receber de Fernando Soares e que ele atrelou a você”, disse Cunha, conforme o depoimento de Camargo. “Eu ainda tenho que receber US$ 5 milhões em relação a este ‘pacote’”, pontuou o deputado, de acordo com o ex-consultor da Toyo Setal.
“Importante ressaltar que nessa reunião Fernando Soares ficou passivo, tendo as negociações sido feitas apenas e diretamente pelo denunciado Eduardo Cunha com Júlio Camargo”, ressalta a PGR na denúncia.