A opinião de Edson Travassos Vidigal: Querem que sejamos sempre mendigos

Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir. A certidão pra nascer, e a concessão pra sorrir. Por me deixar respirar, por me deixar existir. Deus lhe pague”. É como muito bem mostrou Chico Buarque em sua música “Deus lhe pague”, ainda durante a ditadura militar: se dependermos de nossos governantes, seremos sempre mendigos.

Pedintes que se sujeitam ao que for necessário para ter o privilégio de contar com a boa vontade e os favores daqueles que apenas nos respeitam de 4 em 4 anos, quando nos pedem o voto com abraços, beijos, promessas e sorrisos forçados que mostram todos os trinta e tantos dentes de suas bocas, bem como todas as rugas de suas já desgastadas e manjadas caras de pau.

Precisamos nos livrar desta cultura de escravos comendo nas mãos de senhores de engenho, de coronéis do sertão. Precisamos nos livrar dessa condição de pedintes, de mendigos em busca de favores políticos, de esmolas que, além de não resolverem a vida de ninguém, nos são dadas a partir de nosso próprio bolso. Pois com uma mão nos roubam o que temos e com a outra nos distribuem migalhas.

É triste ver que muitos acham que os políticos são pessoas que nos pedem o voto como favor pessoal e, em troca, nos concedem favores pessoais, em uma relação privada, de interesses particulares, às custas do patrimônio público, que é de todos, e não é de ninguém em particular.

É preciso entender que os políticos são (ou deveriam ser) pessoas que se oferecem para cumprir missões públicas específicas, funções muito bem delineadas por nosso ordenamento jurídico, com fins claros e determinados.

Um prefeito, por exemplo, tem como função administrar o município, prestar de forma satisfatória os serviços públicos básicos à população (saneamento, transporte, saúde, educação etc.), executar o orçamento previamente discutido e votado pelos vereadores, e propor políticas públicas que se destinem a resolver os problemas sociais que se apresentem, bem como a desenvolver nossas cidades e nossa sociedade como um todo.

Já um vereador tem a função de, representando o povo, discutir as prioridades, os valores, as demandas e os problemas da sociedade, propondo soluções por meio de projetos de lei, que, sendo aprovados pelo parlamento municipal (a Câmara de Vereadores) são convertidos em leis e sancionadas pelos prefeitos de cada município, para que sejam postas em prática. Ainda, têm por obrigação fiscalizar o trabalho da prefeitura (do Executivo Municipal) e fazer com que este, de fato, seja feito atendendo aos parâmetros ditados por nosso ordenamento jurídico.

O prefeito é o responsável pelo Poder Executivo de cada município, e cada vereador é um representante do povo no Poder Legislativo de cada município.

Da mesma forma, na esfera Estadual o governador é o responsável pelo Poder Executivo, tendo por funções praticamente as mesmas dos prefeitos, porém em relação a todo o Estado. Por sua vez, os deputados estaduais, que representam a população de todo o Estado na Assembleia Legislativa Estadual, têm praticamente as mesmas funções dos vereadores, só que em sua esfera de poder (estadual).

Por fim, o presidente da República é o chefe do Poder Executivo Federal, e tem por funções praticamente as mesmas do prefeito e do governador, só que em relação a todo o país. Da mesma forma, os deputados federais são os representantes da população de cada Estado que, reunidos na Câmara dos Deputados, em Brasília, desempenham praticamente as mesmas funções dos vereadores e dos deputados estaduais, só que em relação ao país como um todo.

Mas e os famosos “senadores da República”, que normalmente já exibem abdómenes poderosos em ternos finos bem cortados e cabelos prateados muitas vezes disfarçados em acaju? Raros são os que sabem para quê eles servem. Sabem que eles são poderosos, ricos, e poucos.

Pois bem, os senadores, que são em número fixo de 3 em cada Estado, e têm 8 anos de mandato, reúnem-se no Senado Federal representando não o povo, mas cada um dos Estados Federados junto à União, pois somos uma federação de Estados e cada um deles tem seus próprios interesses a serem defendidos em Brasília.

Como visto, cada cargo político tem uma função específica, bem delineada. Nenhum deles tem por função fazer favores aos eleitores, resolver problemas pessoais nas repartições públicas, dar dinheiro ou pagar bebidas para pedintes ou qualquer coisa do gênero. Ao cumprirem com suas missões institucionais, não fazem nenhum favor, mas apenas cumprem com suas obrigações.

Da mesma forma, o voto não pode ser dado como favor a ninguém. Deve ser dado como manifestação de confiança naqueles que, de fato, têm capacidade de cumprir com as funções a que se propõem. Com honestidade, probidade, competência e senso cívico. O político sério não pede favores pessoais e não faz favores pessoais. O cidadão sério não pede favores. Cumpre com suas obrigações e cobra que seus representantes eleitos cumpram com as suas.

* Edson José Travassos Vidigal foi candidato a deputado estadual nestas eleições pelo PTC, número 36222. É advogado membro da Comissão de Assuntos Legislativos da OAB-DF, professor universitário de Direito e Filosofia, músico e escritor. Especialista em Direito Eleitoral e Filosofia Política, foi servidor concursado do TSE por 19 anos. Assina a coluna A CIDADE NÃO PARA, publicada no JORNAL PEQUENO todas as segundas-feiras.

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